terça-feira, 16 de maio de 2017

O FIM EM VÁRIAS PARTES - A PRIMEIRA SEMANA

O fracasso estava ali na sala quando eu acordei na segunda feira, em um letreiro de neon. Piscando sem parar: perdedora, bam, bam, bam, perdedora, bam, bam, bam. E então eu me levantava fazia café, cuidava da minha filha durante todo o dia, trabalhava, ouvia uma porrada de ofensas: “ingrata, insensível, maldita, vingativa, louca, puta, mãe de merda, interesseira, velha, feia”, ia para a faculdade, desabafava, voltava para casa cheia de conselhos para mais uma rodada de brigas. Perdedora, bam, bam, bam, perdedora, bam, bam, bam. Não me lembro de como dormia e nem o que comi durante essa semana.
Meu casamento foi uma forma de eu existir pelos olhos do outro, de ser alguém. Uma forma muito estranha de me legitimar na vida magicamente. Fui aparando todas as minhas quinas para caber naquele espaço, tudo que era demais para ele lidar: um sonho que não sonhava mais, uma vontade que era esquecida, uma música de não ouvia, uma roupa que eu não usava, uma amiga que eu não falava. Eu estava sumindo e não queria seguir em frente, muito menos ficar feliz. 
Uma semana depois do fim eu queria estar exatamente onde estava, não queria me animar, arrumar outro emprego, nem colocar minha filha na escola, não queria parar de fumar, nem mesmo comer bem, não queria superar merda nenhuma.
Naquele dia eu sentei na cozinha e fui infeliz, chorei, reclamei, duvidei da vida, da minha sanidade, perdi a fé em mim mesma. Eu, a tristeza, o medo, a morte e a loucura tomamos um café da manhã, porque era domingo de sol, mas eu estava triste. Quis chorar todas as dores passadas, todas as surras e os insultos, todas as perdas que eu nunca tinha chorado. Chorei pelos meus lutos, pelos dias de solidão completa. Reverenciei a tristeza da Mariana criança, da mulher. 
Listei tudo o que me foi negado e olhei para tudo o que eu tinha. Não me movi um milímetro para longe de toda aquela destruição que havia em mim, queria saborear a conquista de me sentir realmente humana e um lixo. Naquele dia não dei a volta por cima.

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